dialética negativa

Thursday, February 28, 2013

Teoria da literatura II 2012-02 sagrado e profano 1



Ginsberg ácido lisérgico traduzido por Claudio Willer
http://claudiowiller.wordpress.com/2013/05/24/ginsberg-e-lsd-um-poema/


Não existe mais nenhuma esfera sagrada que não tenha sido profundamente imbuída de profanidade, assim como, inversamente, não existe nenhum território profano incontaminado sem sedimentos sagrados.

Es gibt keine sakrale Sphäre mehr, die nicht tief von Profanität durchdrungen wäre, wie umgekehrt kein
keimfrei profaner Raum ohne jede sakralen Ablagerungen existiert.
 Türcke, Christoph. Hyperaktiv! Kritik der Aufmerksamkeitsdefizitkultur, C.H.Beck, München 2012, p. 113. 


Eduardo Losso: Mistura de ódio e bondade, humildade e orgulho

Cruz e Sousa: poema de Últimos sonetos

ÓDIO SAGRADO 

Ó meu ódio, meu ódio majestoso, 
Meu ódio santo e puro e benfazejo, 
Unge-me a fronte com teu grande beijo, 
Torna-me humilde e torna-me orgulhoso. 

Humilde, com os humildes generoso, 

Orgulhoso com os seres sem Desejo, 
Sem Bondade, sem Fé e sem lampejo 
De sol fecundador e carinhoso. 

Ó meu ódio, meu lábaro bendito, 

Da minh'alma agitado no infinito, 
Através de outros lábaros sagrados, 

Ódio são, ódio bom! sé meu escudo 

Contra os vilões do Amor, que infamam tudo, 
Das sete torres dos mortais Pecados! 

Lábaro
 substantivo masculino
1 estandarte militar dos antigos romanos
2 Uso: formal.
bandeira, estandarte, pendão


Sobre a relação entre nome - susto - sagrado - maldito


Christoph Türcke - Filosofia do sonho, capítulo 3 - Palavra, Item: "Aí" - "Fora"

Se a palavra primária encontra-se repleta de susto, então ela não está menos completa de um desejo: de se tornar supérflua. A palavra quer exterminar do mundo o seu motivo, o susto - e assim a si mesma. 
Por essa razão, ela promove o constante início de nova formação de som. Desse modo, porém, ela se fixa precisamente nele, o susto. A formação do som intermitentemente o provoca; em torno dele ela circula; as suas formas iniciais altamente excitadas, trementes e oscilantes nele se firmam para uma primeira estabilidade. Então não pode faltar que precisamente o susto, à medida que ela o modela, torne-se o seu sujeito, o seu apoio. Exatamente esse processo pode-se depreender da relação entre cham, 
chamah e chem.
(OBS: Eduardo Losso: chamah é uma das pronúncias da palavra hebraica sm que Ezequiel usa que ora significa, "aqui e agora", ora "olhar estarrecido, horror, arrepio"; cham é outra pronúncia, que significa "aí" e chem é outra que significa "nome" p. 234-235)
 O pré-nome cham quase nada mais é que o eco do susto estremecendo o organismo todo. O substantivo chamah já é uma palavra para esse processo. Ele já tem tanta distância disso que pode captá-lo como 
uma espécie de objeto: como estarrecimento, horror. E chem? A pequena mudança de vogal de a para e representa uma alteração profunda sem igual: da exclamação exorcista para a nomeação. Dar-lhe um nome é a tentativa de transformá-lo de uma violência mortal numa força de proteção salvadora e, assim, levá-lo ao desaparecimento. A fuga para diante, que a compulsão traumática inicia à medida que com isso tenta libertar-se do amedrontador, realizando-o intermitentemente em regência própria, tornando-o desse 
modo suportável, tangível, costumeiro, até familiar, em que precisamente o assustador autoproduzido torna-se refúgio, salvação do assalto súbito do susto - essa colossal inversão encontra a sua forma linguística na formação do nome. O nome é aquela combinação de sons firmada, pela qual tanto o estremecimento traumático consegue ar, quanto também o susto é chamado, conjurado para que seja o seu contrário, isto é, o poder que dele nos livra. Dito teologicamente: o nome é a palavra que sacraliza o susto. Ou também: 
o sagrado é o susto salvador provido de um nome, o susto "ornamentado". Quando "aí" significa "fora" e "susto" "salvação": apenas aí encontramos as palavras primitivas de sentido oposto. Implicitamente ele 
se encontra no pré-nome cham, torna-se explícito em chem, o nome. O nome é o sentido oposto por excelência. Mais ainda: todo o sentido inicialmente é sentido oposto. O sentido veio ao mundo somente pelo bendizer do susto. O sentido oposto originário deixa as oposições confluírem umas nas outras. 
Quando, porém uma palavra de acordo com o contexto pode significar uma vez algo, e outra vez o seu contrário, aí a confluência das oposições já cedeu ao "tanto-quanto-também", o sentido oposto ao duplo sentido. A palavra egípcia ken, dependendo da situação, pode significar tanto "forte" como também "fraco"; a palavra latina altus, tanto "alto" quanto "fundo"; sacer tanto "sagrado" como "maldito". Os exemplos de Abel iniciam todos eles com o sentido duplo. Eles nem avançam até o sentido oposto. Nomear o susto antes de tudo precisamente não significa ainda lhe dar duas significações opostas, isto é, sagrado e assustador, o que para os ouvidos modernos soa como bom e mau, mas que o sagrado é o susto nominado. 
O susto, portanto, não é o mal; pois ele precisamente é bendito. Mesmo a significação de "maldito", que a palavra latina sacer adquiriu, no início é o mesmo que "sagrado". Ninguém é mais sagrado dentre os companheiros do clã do que aquele que a sorte atinge e o destina ao sacrifício que os outros devem oferecer à assutadora força de proteção. No jogar a sorte, a bênção e a maldição ainda estão indivisas. Aquele que é atingido é literalmente distinto: 
tabu como dizem os polinésios. Bênção e maldição somente sc separam com a abolição do sacrifício humano. Quando se abre a possibilidade de sacrificar animais em vez de homens, e mesmo assim homens são mortos por vontade coletiva, "em nome do povo", eles não são sacrificados, mas executados. 
Somente então, "consagrado à morte" não é mais o mesmo que "escolhido", mas o contrário: rejeitado. Somente agora "maldito" significa o mesmo que "mau". Mau é tudo aquilo que se exime das reivindicações do sagrado e por isso lhe é tirada a sua proteção. Ser repudiado, sem nome, sem proteção, ou, como se diz mais tarde, cm banimento e excomunhão: essa é a condição de simplesmente mau, rejeitado.
Türcke, Christoph. Filosofia do sonho. Ijuí : Unijuí, 2010, p. 241-243

Eduardo Losso: para analisar a relação entre terror, medo, fantasma, mistura de pavor e adoração, LER o poema em prosa de Cruz e Souza "A sombra"

Cruz e Sousa, João da. 1861-1898 
Cruz e Sousa: obra completaRio de Janeiro : Nova Aguilar, 1995, p. 641-647.



Rudolf Otto - O sagrado

2. Do estado de espírito numinoso em Paulo nem é preciso falar. "Deus habita uma luz inacessível." (1Timóteo 6:16)
A exuberância do conceito de Deus e do sentimento de Deus leva-o à experiência mística 
{112 Não como definição suficiente, mas como característica essencial da mística eu diria que ela é religião com preponderância unilateral dos seus elementos irracionais, 
onde estes se refletem em arrebatamento exagerado. - Uma religiosidade adquire 
"tom místico" ao apresentar essa tendência. Nesse sentido o cristianismo desde Pau-
lo e João não é mística, mas religião com tons místicos}
, presente em sua exaltação entusiástica geral e no uso carismático [pneumatisch] da palavra, característi-
cas estas que superam em muito o aspecto estritamente racional da espiritualidade cristã. As catástrofes e peripécias na trajetória dos sentimentos, a dramaticidade do pecado e da culpa, o ardor da experiência entusiástica somente são possíveis e compreensíveis em solo numinoso. Assim como a "ira de Deus" é para Paulo mais do que mera reação da justiça punitiva, estando antes perceptivelmente impregnada do elemento tremendo do numinoso, por outro lado também o elemento fascinante do amor de Deus por ele vivenciado, que impele seu espírito para fora dos seus limites e para o terceiro céu, é mais do que o sentimento filial humano e natural levado a termos absolutos. Em Paulo, a ira de Deus faz-se poderosamente presente 
na grandiosa passagem de Romanos 1.18ss. Ali reconhecemos diretamente o Javé irado e "zeloso" do Antigo Testamento, só que agora como temível e poderoso Deus do universo e da história, que sobre o 
mundo derrama sua ira flamejante. Genuinamente irracional, inclusive de uma excelsitude aterradora {113
113 Nota do trad.: o sentido intencionado de grauenvoll-erhaben, a julgar pelo contexto, é provavelmente o "de um distanciamento soberano aterrador"; nesta passagem parece prevalecer em erhaben a conotação de distanciamento presente na expressão idiomática über etwas erhaben sein: "não deixar-se impressionar por algo", "estar acima [do bem e do mal, por exemplo]", "não deixar-se atingir por algo"}

 é ali a visão de que o furioso puniria o pecado fazendo pecar. Em três abordagens diferentes, Paulo repete essa idéia totalmente insuportável para o modo de encarar estritamente racional: 

Por isso Deus os entregou à impureza em que eles mesmos desonraram seus corpos. 
Por isso Deus os entregou a paixões aviltantes. 
Assim Deus os entregou à atitude de desprezo, para fazerem o que não convém, tomados de toda injustiça. 
(Romanos 1:24-25)

Para se sentir o impacto dessas visões é preciso tentar esquecer o ambiente das nossas dogmáticas e catecismos moderados e sentir os arrepios do judeu confrontado com a fúria de Javé, do helênio 
frente à Heimarmenë [sina] aterradora e do homem antigo frente à ira dos deuses de um modo geral. 

 Otto, Rudolf. O sagrado: os aspectos irracionais na noção do divino e sua 
relação com o racionalPetrópolis: Vozes, 2007, p. 123-124



E depois analisar essas associações ao início de Hamlet, de Shakespeare:

http://www.youtube.com/watch?v=hiSE9WDbwa8


1 Comments:

Post a Comment

<< Home